K'un, a Terra, acolhe Ken, a Montanha, formando Po, Desintegração, a Fuga da Luz






O Fio da Meada







Sexta Linha      ___  ___               O
Quinta Linha         ___  ___          I Ching
Quarta Linha                ___  ___               do
Terceira Linha       _______          Caminho
Segunda Linha      _______               do
           Primeira Linha    _______              Céu





Janine Milward





SEGUNDO VOLUME

Os Hexagramas compostos por K'un, a Terra,
a Mãe, o Receptivo, o Abranger, o Devocional, a Não-Luz, o Vazio
a Planície, o Povo



Editora Estrela do Belém




O Fio da Meada


 I Ching do Caminho do Céu

Janine Milward

Direitos Reservados © 1997
Registro 142.090 Livro 230 Folha 433
Segunda Edição Revisada






A Terra acolhe a Montanha,
 formando 
Po, Desintegração, a Fuga da Luz

Janine Milward




K’un, A Terra, O Vazio, O Receptivo, O Abranger, A Devoção, O Princípio Obscuro, A Não-Luz, após encontrar-se consigo mesma... dá início a todos os outros encontros entre os Trigramas.

Assim, K’un, A Terra, O Vazio, encontra-se com Ken, A Montanha, A Quietude, o Filho mais Jovem, e ambos formam o Hexagrama 23. Po, A Desintegração, dentro do Mundo da Manifestação, e o segundo Hexagrama dentro do I Ching do Mundo da Não-Manifestação


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___ ___           Ken, A Montanha, A Quietude, Trigrama Visitante
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___ ___           K’un, A Terra, Trigrama Primordial
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Ken, a Montanha, a Quietude, é também o Mestre, a representação do Filho do Céu e da Terra: o Homem.  A Linha da Terra liga o Homem à Terra, seu lugar de encarnação e de realização de seu Caminho.  É uma Linha Yin e receptiva à plenitude da materialização do espaço, a vida no Planeta Terra.  A Linha do Homem, idealmente correta por ser Yin e receptiva, é aquela que realiza o Homem em sua ligação com a Terra e o Céu.  Finalmente, a Linha do Céu, idealmente correta por ser Yang e ativa, é aquela que efetivamente liga o Mestre ao Céu (trazendo consigo as duas outras Linhas Yin e receptivas) no sentido do Homem realizar sua mente junto à Luz do Criativo, do Pai, do Céu, do Sublime Yang.

Ao se posicionar no Trigrama do Céu, Ken, a Montanha, a Quietude, realiza o Mestre em sua exteriorização plena - e tudo isso é plenamente possível ao ser estruturado por K'un, a Mãe, a Terra, o Receptivo, no Trigrama da Terra.

K’un, A Terra, é a própria significação do Trigrama da Terra. O Trigrama da Terra, ou Trigrama Primordial, ou Trigrama Inferior, ou Trigrama Interno, é aquele que não apenas dá sustentação ao Hexagrama em si – por representar a própria Terra, a base, a estrutura, como também quase sempre nos traz a idéia de algo que se encontra velado, ainda não revelado; coberto, ainda não descoberto, interiorizado.

Diferente do Trigrama do Céu que – por representar o próprio Céu – é aquele que repousa sobre a base, a estrutura do hexagrama em si, como também nos traz, quase sempre, a idéia de algo que se encontra revelado e não-velado, descoberto e não-coberto, exteriorizado.

As Virtudes de K’un, A Terra, são as qualidades essenciais do Homem Sagrado. E essas qualidades devem ser vivenciadas tanto dentro dos preceitos da Terra como do Céu:  K’un, A Terra, A Mãe, O Vazio, A Não-Luz, A Obscuridade, A Devoção, O Receptivo, O Abranger, O Abranger, A Abnegação, A Humildade, A Paz, A Pureza, A Retidão, A Bondade, A Perseverança, A Docilidade, O Povo, O Reino, O Coletivo, As Massas, A Planície, o Vale o Prado.

Na Terra, as Virtudes de K’un, A Terra, levam o Homem Sagrado à compreensão sobre a consagração de seu corpo físico, elevando-o a altos níveis de espiritualidade a ponto de torná-lo um Corpo de Luz - que é o processo de mutação de toda a matéria existente no universo - e libertá-lo da Roda da Vida.

Luz é matéria e assim sendo, é dentro da Terra, da matéria, da encarnação real e vivenciada, que o Homem Sagrado atinge sua Iluminação e sua Liberação, sua Imortalidade, sua Luz própria – sua Consciência infinita e sua Vida infinita!


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___ ___           Ken, A Montanha, A Quietude, Trigrama Visitante
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___ ___           K’un, A Terra, Trigrama Primordial
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Em Po, Desintegração, A Fuga da Luz, Montanha sobre Terra, Ken sobre K’un, A Mãe recebendo a visita do Filho mais Jovem, existe uma Linha Yang na posição Céu do Trigrama do Céu, revelando o último instante da permanência da Luz do Sublime Yang, de Ch’ien, O Céu, O Criativo.

A Verdade é que se o Hexagrama K’un, A Terra sobre Terra, nos diz sobre o momento da vinda do Inverno - através todas suas Linhas Yin, da Não-Luz...., em Po, Desintegração, temos o momento último de Luz ainda vigorando, antes da entrada e da permanência de todas as Linhas Yin, o Inverno!  É por isso que esse Hexagrama nos fala sobre tudo aquilo que deve encontrar sua finalização, sua conclusão, e seu momento de plenitude de Vazio.... até que possa existir o Retorno da Luz!  O Retorno da Luz acontece quando essa mesma Linha Yang, em Po, a Sexta Linha, ao deixar o Hexagrama constando apenas de Linhas Yin - em K’un, O Vazio, O Inverno -, retorna, porém agora, em seu Retorno, aparece como Primeira Linha Yang, trazendo o Retorno da Luz!

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Po,                   K’un,               Fu,
Desintegração   O Receptivo    O Retorno da Luz


A Sexta Linha que se retira do Hexagrama Po, Desintegração, é como o fruto maduro cheio de sementes contendo A Vida do Criativo, a Linha Yang, que cai no chão em K’un, O Receptivo, para penetrar na Terra e enraizar e tornar-se uma outra planta, uma outra árvore, um outro sêr, uma nova vida.

Antes de retornar, em Fu, O Retorno da Luz, O Ponto de Transição, A Luz da essência da semente se fusiona com a Não-Luz de K’un, O Vazio, a Terra.

Assim, a Linha Yang no topo da Montanha - alta Montanha - é a imagem do instante anterior do fruto desligar-se do tronco da árvore, cair no chão e deteriorar-se até expulsar a semente que traz consigo a re-criação.

Em Po, Desintegração, a Fuga da Luz, encontramos a verdade do processo da Entropia: todos os compostos de deterioram, se decompõem, na Criação, no Mundo da Manifestação. 


O Hexagrama Po, Desintegração, a Fuga da Luz, e a Meditação

Sabemos que a Montanha é Ken, a imagem do mestre sentado em seu Vazio, em sua Meditação.  Esse mestre está encarnado no Planeta Terra, plenamente materializado.  E também sabemos que Luz é matéria. Encarnamos nesse Planeta Terra, Planeta de plenitude de materialização, para realizarmos nosso Trabalho e nosso Caminho de Iluminação e nosso Caminho de Liberação ou Imortalidade.  E é exatamente a imagem da Montanha, Ken, que nos revela, através a figura do mestre, essa nossa inserção entre o Céu e a Terra, nossa realização na matéria e na espiritualidade.

Em Po, Desintegração, essa imagem do mestre, Ken, A Montanha, A Quietude, é sustentada pela Terra, K’un, A Devoção, que tem por Virtude, a Humildade. A Humildade da Terra está em ascensão, ou seja, avançando em suas Linhas, até alcançar o Céu do Trigrama do Céu.  Alcançando o Céu, todas as Linhas se tornam Yin e fazem surgir K’un, a Terra, a Plenitude do Vazio, A Ausência da Luz, A Não-Luz.  Dessa maneira, o homem superior penetra em seu Vazio.

No processo de meditação, Po, Desintegração, é o último instante da mente consciente, do pensamento, do sentimento, da emoção, da sensação, da ilusão, enfim, de tudo, antes de alcançar o Vazio e a Não-Luz do Sublime Yin de K’un, A Terra, O Vazio.

É o último lampejo da mente consciente, anunciando que em breve a escuridão total prevalecerá.  É o tempo de temor pela perda da mente consciente do domínio do corpo físico.  E a perda da mente consciente não significa perda da consciência.  É sempre através do Vazio que a consciência alcança sua iluminação, a consciência do Vazio.


Trinta raios convergem ao vazio do centro da roda.
Através dessa não-existência
Existe a utilidade do veículo.
..............................
Assim, da existência vem o valor
E da não-existência, a utilidade.

Tao Te Ching, Capítulo 11, Lao Tsé


A não-existência faz parte do Mundo da Não-Manifestação.  A existência faz parte do Mundo da Manifestação.  Quando o mestre abandona a mente consciente e o domínio do corpo físico, ele estará se colocando no Portal existente entre o Mundo da Manifestação e o Mundo da Não-Manifestação.

Sendo assim, em Po, Desintegração, a Fuga da Luz, a Sexta Linha, a Linha Yang do cume da Montanha, nos revela esse momento último dentro do Mundo da Manifestação.  O Portal entre os dois mundos será encontrado através de K’un, O Devocional, O Vazio, a Não-Luz, nos trazendo o Orifício Misterioso - o Revirão do oito do Céu Anterior, do Mundo da Não-Manifestação.

O Espírito do Vale nunca morre
Isso se chama Orifício Misterioso
A porta do Orifício Misterioso
É a raiz do céu e da terra
Seja suave e constante
Usufruindo sem se apressar.

Tao Te Ching, Capítulo 6, Lao Tsé


Quando o Vazio realmente se instaura, a Terra, K’un, torna-se o Céu, Ch’ien, O Criativo: esse é o I Ching do Caminho do Mundo da Não-Manifestação, apresentando todos os Hexagrama sendo construídos a partir da Terra, A Mãe, até finalmente encontrar-se com o Céu, O Pai, perfazendo 64 Hexagrama.

Depois do momento do Vazio - quando acontece o lampejo da Iluminação, o insight, o breve instante da recepção da Luz dentro do Vazio -, essa Luz retorna, adentrando um novo Hexagrama, formando Fu, O Retorno da Luz, O Ponto de Transição, recuperando a Linha Yang já como Primeira Linha. 

(Fu, O Retorno, é o Hexagrama 24, dentro do I Ching do Mundo da Manifestação, seguindo Po, Desintegração, que é o Hexagrama 23).


 



O Julgamento


No I Ching, se diz no Julgamento: "Desintegração. Não é favorável ir a parte alguma”.

O I Ching menciona o avanço das Linhas obscuras que vêm trazendo o mal (em contraposição ao bem) consigo.  Sendo assim, não é favorável se empreender coisa alguma.

A Terra, dentro do Trigrama da Terra, pressupõe a energia interiorizada trazendo consigo a Docilidade, a Devoção, a Receptividade.  E a Montanha, dentro do Trigrama do Céu, pressupõe a energia exteriorizada trazendo consigo a Quietude. 

Portanto, o I Ching aconselha a aceitação da época adversa, mantendo-se a quietude, e nos diz para não nos esquecermos que tudo passa, que tudo sempre está em constante mutação.  Em momentos de ação, deve-se agir; em momentos de não-ação, deve-se observar o ciclo que se está passando e submeter-se, evitando a ação.  A não-ação não significa nada fazer; significa sim, agir quando é momento de agir e não agir quando o momento não é adequado. 

A não-ação significa agir naturalmente, de acordo com o momento, sempre, no entanto, conservando a observação dos ciclos que começam, duram e passam e ao mesmo tempo discernindo sobre os mesmos e sobre o melhor momento de agir ou de não-agir.

Quando se trata do Inverno - inexoravelmente anunciado por Po, Desintegração, a Fuga da Luz, e concretamente realizado em K'un, a Terra, o Abranger, a Não-Luz -, vemos que a natureza faz sair de cena tudo aquilo que parecia conter a vida: é tempo de dormência: por isso, o I Ching diz: Desintegração. Não é favorável ir a parte alguma.



 


A Imagem


Na Imagem, o I Ching  nos diz:  A Montanha repousa sobre a Terra: A imagem da Desintegração.  Assim, os superiores só podem garantir suas posições mediante dádivas aos inferiores.

Sendo K’un, a Terra, o Vazio, e Ken, a Montanha, a Quietude, encontraremos ambos dentro do movimento descendente.... e a Montanha sobre a Terra parece afundá-la ainda mais, ruindo, desabando, desintegrando...  Assim, o homem superior procura ser como uma Montanha formada a partir de uma larga base para então poder seguir ereta, imajando o Mestre sentado em silêncio em sua meditação.  Dessa forma, K’un, a Terra, o Receptivo, sustentará a Montanha, harmoniosamente, em seu repouso e assentamento.

O homem superior não constrói para si uma montanha íngreme e mal assentada, mal embasada.  A Terra, K’un, é generosa, é devocional, é abrangente.  Sendo dessa forma, a Terra pode conceder à Montanha toda a terra, todo o embasamento necessário, para o acúmulo e a existência da montanha.

É por isso que o I Ching nos diz em sua Imagem: Assim, os superiores só podem garantir suas posições mediante dádivas aos inferiores.

Lao Tsé nos diz em seu Capítulo 64 do Tao Te Ching:

Uma torre de nove andares levanta-se de um acúmulo de terra.

Generosidade é uma Virtude da Terra; Quietude é uma Virtude da Montanha.  Quando ambas essas Virtudes se unem, dão lugar ao Vazio, que, por sua vez, abrangerá a Sublime Luz.


 



Trigramas e Hexagrama Nucleares


Os Trigramas Nucleares inseridos em Po, Desintegração são K’un, A Terra, repetida.

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___ ___                      ___  ___                                            ___  ___
___ ___                      ___  ___                                            ___  ___
___ ___                      ___  ___            ___  ___                   ___  ___
___ ___                                                ___  ___                   ___  ___                    
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Po, Desintegração                                                                K’un, A Terra,
                                                                                              O Receptivo

Como vimos, o Hexagrama Nuclear que se forma é K’un, A Terra, O Vazio, revelando a inexorável realidade de que a Não-Luz do Sublime Yin está sempre presente, e está quase chegando.  É o momento de adeus à Luz de Ch’ien, O Criativo, a Linha Yang ao alto, a Sexta Linha, a Linha do Sábio, que se retira, para ingressar no Vazio de K’un, O Receptivo.  É o adeus do Verão do Criativo, com todas as Linhas Yang, para ingressar no Inverno do Receptivo, com todas as Linhas Yin.

Po, Desintegração, nos diz que tudo no universo sempre chega ao seu final e que esse final é a ponte para uma nova realidade, uma nova existência, a ser iniciada depois de K’un, A Terra, o Vazio, através Fu, O Retorno da Luz, o Retorno da Vida.

Sendo a Terra dócil e a Montanha sábia, no I Ching do Céu Anterior, do Mundo da Não-Manifestação, o último lampejo de Luz revela tão somente o começo do Caminho do Caminhante em direção ao seu Tao.

Na meditação, a entrada no Vazio é propiciada pelo momento chamado de Fixação.  A Fixação é um estado que se sucede à quietude do pensamento, do movimento, até da própria respiração.  É a fusão do Sopro do Céu Posterior com o Sopro do Céu Anterior.  É a fusão da Consciência do Céu Posterior com a Consciência do Céu Anterior.  É o momento do Revirão, quando tudo pára e termina, o coração bate bem devagar e a respiração torna-se apenas um leve sopro.  É através da Fixação que se permite mergulhar no Vazio.  Assim, Po, Desintegração, é a imagem desse instante, o ingresso no Vazio, e será o Hexagrama K’un, Nuclear, que nos revela essa verdade.

Alcançando o extremo vazio
E permanecendo na quietude da extrema quietude.

Tao Te Ching, Capítulo 18, Lao Tsé



 


As Linhas


O Trigrama da Terra, em K'un, a Terra, significa o lugar do repouso, onde se assenta, onde se dorme, onde a não-ação acontece.  O Trigrama do Céu, em Ken, a Montanha, significa o Homem, aquele que se assenta sobre K'un, a Terra, para realizar sua Meditação (o Sentar-se em Silêncio), aquele que repousa, aquele que se encontra em estado de não-ação (fusionando a Não-Ação enquanto Virtude K'un, a Terra, e a Quietude, enquanto Virtude Ken, a Montanha).

Sendo assim, os Textos para as Linhas, em Po, Desintegração, a Fuga da Luz, pressupõe uma cama e aquele que repousa sobre esta cama.

Em função do fato de que as Linhas de um Hexagrama executam uma movimentação de baixo para cima, encontraremos a Desintegração, a Fuga da Luz, Po, acontecendo a partir das Linhas do Trigrama da Terra e adentrando, da mesma forma, as Linhas do Trigrama do Céu. 

Com exceção da Sexta Linha, Linha Yang do Sábio, todas as demais Linhas são Yin e receptivas e exercem a não-ação e permitem que Po, a Desintegração, vá galgando cada um dos significados das Linhas - menos a Quinta Linha, que já se encontra mais energizada pelo fato de antecipar a Linha  Yang ao alto do Hexagrama.

Sendo a Sexta Linha uma Linha Yang, esta não se deixa abater pela escalada, pela ascensão de Po, Desintegração, a Fuga da Luz - mesmo que esta posição já apresente o fato de sua retirada  eminente do Hexagrama!  Portanto, é a Sexta Linha a Linha Governante do Hexagrama.


 



Linha a Linha


K’un, A Terra, é a imagem do chão, ou da cama.  Ken, a Montanha, é a imagem do sêr que repousa sobre a cama.


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___ ___           A Primeira Linha


O I Ching diz: A perna da cama se desintegra.  Os perseverantes são destruídos.  Infortúnio.

Sendo as Linhas sempre lidas de baixo para cima, a Primeira Linha - Linha Yin em lugar idealmente Yang - nos traz os pés da cama.  Podemos perceber essa cama como um catre alto, com todas as Linhas Yin como seus pés e a Linha Yang ao alto como o lugar de se deitar, na horizontal. 

O I Ching nos diz que os pés da cama são desintegrados porque são, não apenas o início do avanço da Não-Luz, da obscuridade, como também é uma Linha Yin, frágil, maleável, em lugar idealmente Yang, forte, estruturador.  O infortúnio advém, portanto, do fato de ser uma Linha idealmente incorreta e, a continuar o avanço das Linhas Yin ao longo do Hexagrama, os perseverantes, ou seja, aqueles que estão sendo imajados pela Linha Yang ao alto de Po, Desintegração, aguardam também por suas desintegrações, decomposições, destruição.  Tudo isso acontece pelo fato de que ambas as Linhas correspondentes - Primeira e Sexta (começo do Hexagrama e conclusão do mesmo) serem idealmente incorretas.




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___ ___           A Segunda Linha
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O I Ching diz: O canto da cama se desintegra.  Os perseverantes são destruídos.  Infortúnio.

Na Segunda Linha, Linha Yin do Homem da Terra, o avanço da desintegração atinge o próprio homem, no sentido de lhe trazer a solidão.  A solidão acontece porque até então as Linhas Yin avançam, embora estejam sempre solitárias, sem correspondência com o Trigrama do Céu.  E não podemos nos esquecer que a Linha Yin é a Não-Luz, a obscuridade, daí o sentimento de solidão - embora a Segunda Linha esteja idealmente correta.  Da mesma forma que vimos mais acima, o I Ching novamente diz que os perseverantes são destruídos e que isso causa infortúnio.


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___ ___           A Terceira Linha
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O I Ching diz:  Rompendo sua ligação com eles.  Nenhuma culpa.

A Terceira Linha - mesmo sendo Yin em lugar idealmente Yang -, mantém sua correspondência com a Linha do cume do Trigrama do Céu, do cume da Montanha, a Linha que sofrerá a Desintegração...., enquanto a Terceira Linha é o cume do Trigrama da Terra, portanto, em meio ao processo de Desintegração.

Sendo Yin, e não Yang idealmente, a Terceira Linha não tem relações com seus vizinhos - as Linhas anteriores e a Quarta Linha, bem como a Quinta Linha, todas Yin.  E o I Ching nos diz que “nenhuma culpa” existe em seu envolvimento com a Sexta Linha.



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___ ___           A Quarta Linha
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O I Ching diz:  A cama desintegra-se até a pele.  Infortúnio.

A Quarta Linha  - Linha Yin e idealmente correta - já se encontra no Trigrama do Céu, e assim, em Po, Desintegração, já encerra a imagem de alguém repousando por sobre a cama que está sendo desintegrada, pouco a pouco, e isso causa infortúnio.  O temor da chegada da Desintegração se refere ao fato de que, inexoravelmente, o avanço das Linhas Yin será bem sucedido.  O verão dará lugar ao inverno, a Luz dará lugar à Não-Luz, a plenitude dará lugar ao Vazio.  E como a Quarta Linha encontra-se idealmente correta - é Yin em lugar Yin -, sente-se temerosa sim, mas tendo que se curvar às circunstâncias.




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___ ___           A Quinta Linha
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O I Ching diz:  Um cardume.  Favores vêm através das damas do palácio.  Tudo é favorável.

Sempre a Quinta Linha é a Linha da Consciência, o chamado Lugar do Rei, lugar da Consciência ampliada.

A Quinta Linha - Linha Yin em lugar idealmente Yang, portanto incorreta - já não teme o perigo que se aproxima.  A Quinta Linha não teme o perigo, a Desintegração que chega -  porque não a vê mais como Desintegração e sim, como parte do ciclo da renovação da vida, da Roda da Vida.  A Quinta Linha é a Linha do Rei.  Sendo Yin - e não Yang ideal - ela nos apresenta a rainha que se faz acompanhar de suas damas de companhia - as quatro Linhas Yin anteriores às quais o I Ching nomeia enquanto ‘um cardume’.

É na Quinta Linha que as Linhas Yin anteriores se agrupam, deixam de estar isoladas.  Assim, toda a côrte do reino se aproxima em conjunto (K’un, A Terra, é o povo, a multidão, a massa, o feudo, o conjunto de pessoas reunidas) e se submetem à Sexta Linha, a única Linha Yang do Hexagrama, o último vestígio de Luz, em Po, Desintegração.




_______          A Sexta Linha
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O I Ching diz:  Um grande fruto ainda não foi comido.  O homem superior recebe uma carruagem.  A casa do homem inferior se desintegra.

A Sexta Linha  - Linha Yang em lugar idealmente Yin -, acaba trazendo para si a governança do Hexagrama - mesmo que seja Yang em lugar idealmente Yin.  Isso acontece em virtude sua qualidade Yang de ser que ainda consegue deter energicamente o avanço das Linhas Yin.  É a força do Sublime Yang contendo a docilidade e o Vazio das Linhas Yin.  Porém, o avanço das Linhas Yin é inexorável... e a Sexta Linha sabe bem disso.  Mas sabemos que a Sexta Linha é a Linha do sábio.  O sábio é o fruto cheio de sementes; é o fruto maduro.  Sendo assim, o sábio sabe que tudo terminará, que a Luz  desaparecerá e o Vazio prevalecerá, em K’un, O Receptivo.  Mas o sábio também sabe que essa mesma Luz retornará, trazendo a renovação da vida e as sementes contidas no fruto e espraiadas no chão voltarão a brotar, a enraizar, a trazer as árvores com flores, frutos e novas sementes - em eterna mutação.  Esse retorno da Luz acontecerá, como vimos anteriormente, dentro de Fu, o Retorno.

A Sexta Linha traz consigo a governança do Hexagrama por ser a Linha do sábio e por compreender os sinais dos tempos e suas renovações de vida.  esse é o caminho do homem superior: fluir com o ciclo de Luz e de Não-Luz, realizando a não-ação, com naturalidade, assim é o Tao.

O I Ching nos diz que a casa do homem inferior - as demais Linhas Yin do Hexagrama Po, Desintegração - se desintegra (em função do fato de que a única Linha Yang estará deixando o Hexagrama, fazendo com que o  teto da casa formada desde o Trigrama da Terra e ainda ao longo do Trigrama do Céu em suas Linhas Yin - nomeados de homem inferior -, desabe e acabe por fazer todo o restante da casa do homem inferior também desabar. 

E o I Ching nos diz também que, para o homem superior, essa casa desintegrada - as Linhas Yin - transforma-se em carruagem, o que traz a movimentação do Hexagrama, da Sexta Linha, do fruto caído que abre suas sementes...  Assim, a Montanha imajando o mestre, o homem superior, senta-se em seu silencio e espera pelo Vazio que não tardará a chegar.

Quem se iguala à Virtude, adquire a Virtude
Quem se iguala à perda, perde o Caminho.
Tao Te Ching, Capítulo 23, Lao Tsé


COM UM ABRAÇO ESTRELADO,
Janine Milward






Síntese de Po, Desintegração, a Fuga da Luz


A Terra recebe a Montanha,
formando Po, Desintegração, A Fuga da Luz


Em seu segundo encontro, K'un, A Terra, A Mãe, O Vazio, recebe Ken, A Montanha, A Quietude, O Mestre, O Filho mais Jovem, e ambos formam o Hexagrama Po, Desintegração, a Decomposição, a Fuga da Luz.

Como K’un, A Terra, A Mãe, a representação do Vazio e da Não-Luz, anseia por se encontrar com Ch’ien, O Céu, O Pai, a representação do Criativo e da Luz, seu segundo (da totalidade de 64 Encontros ou Hexagramas) encontro é com o Filho que lhe trará o vislumbre da Luz que restou..... Dessa forma, K’un, A Mãe Terra, encontra-se com Ken, A Montanha, A Quietude, O Mestre, a representação do Homem dentre o Revirão dos Oito Trigramas Primordiais.... Juntas, Terra e Montanha, formam o Hexagrama Po, Desintegração, A Fuga da Luz:

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___ ___           Trigrama do Céu ou Exterior, em Ken, A Montanha
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___ ___           Trigrama da Terra ou Interior, em K'un, a Terra
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Depois de encontrar-se consigo mesma, K'un, A Terra, forma a rocha, a montanha, a terra firme e bem assentada. Se bem olharmos uma montanha em seu triângulo maciço, estaremos vendo a figura de um ser humano sentado em sua meditação... Assim, é o Mestre, o Filho mais Jovem do Céu e da Terra, quem primeiramente inicia o Caminho do Céu entre a K'un, A Terra, e Ch'ien, O Céu.

O homem é aquele que se situa entre o Céu e a Terra porque assim ele se compreende - devido ao uso de sua mente e à expansão de sua consciência. Dessa forma, Céu e Terra passam a existir no Mundo da Manifestação a partir do homem se compreendendo como Homem.

Em Po, Desintegração, existe uma Linha Yang na posição do Sábio, do Céu no Trigrama do Céu, revelando o último instante da permanência da Luz do Sublime Yang antes da Plenitude do Vazio se instalar. 

Para o Homem Superior, para o Mestre que senta-se em seu silêncio, em meditação profunda e dentro da Alquimia Taoísta, Po, Desintegração, é seu momento diante do Portal entre o Mundo da Manifestação, de onde adveio, e o Mundo da Não-Manifestação, onde pretende adentrar.  No Caminho do Céu este Hexagrama revela, então, a imperiosidade do Eterno Retorno a acontecer sempre até que o Homem se torne Homem Sagrado, realmente, tendo alcançado não somente seu Caminho da Iluminação como também seu Caminho da Liberação ou Imortalidade.

No Caminho ao inverso, quando Ch'ien retorna até K'un, quando o Céu retorna à Terra, encontraremos Po, Desintegração, como a última réstia da Luz do Criativo antes de acontecer o Vazio de K'un, a Terra, antes da conclusão do Caminho da Terra.

Novamente, está o Homem Sagrado diante do Portal entre o Mundo da Manifestação e o Mundo da Não-Manifestação.

Quando o Vazio se instaura, a Terra torna-se o Céu, K'un transmuta-se em Ch'ien, o Vazio faz novamente advir o Criativo e a vida instala-se, em constância e em duração.

Por isso, em Po, Desintegração, o último momento do Outono já anunciando a chegada do Inverno, da Não-Luz,  a Sexta Linha, a única Linha Yang do Hexagrama, o Lugar do Sábio, o Céu do Trigrama do Céu, mesmo após sua Retirada, sua Desintegração, sua Decomposição, não deixa de conter em si a Vida advinda da Luz de Ch'ien, o Céu, e retorna - após sete etapas - para inaugurar um novo Hexagrama - que será Fu, o Retorno da Luz, Terra sobre Trovão, anunciando que o Inverno, em K'un, o Receptivo, a Não-Luz, terminou e que a Primavera estará retornando, em breve, anunciando o retorno da Luz, da Vida.  O Verão acontece em Ch'ien, o Céu, o Criativo, com todas suas Linhas Yang.

Vemos, então, que a Linha Governante do Hexagrama Po, Desintegração, é a Sexta Linha - a Linha do Sábio que leva consigo a vida constante de Ch'ien, o Céu, o Pai, o Criativo. 

E, em termos dos Trigramas Nucleares inseridos, encontraremos K'un, a Terra repetida, confirmando a chegada do Inverno, da Não-Luz, a Fuga da Luz.

COM UM ABRAÇO ESTRELADO,
Janine Milward





Tao Te Ching , O Livro do Caminho e da Virtude – Lao Tsé
Traduzido por Wu Jyh Cherng – Editora Ursa Maior

O I Ching, O Livro das Mutações
Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários de Richard Wilhelm
Tradução para o português de Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Correa Pinto
Editora Pensamento – São Paulo, Brasil

I Ching, Alquimia dos Números
Wu Jyh Cherng
Editora Objetiva - Rio, Brasil




O Fio da Meada


 I Ching do Caminho do Céu

Janine Milward

Direitos Reservados © 1997
Registro 142.090 Livro 230 Folha 433
Segunda Edição Revisada